A pedra foi retirada. E ela era muito grande.
Desnudada, reconheço o amor.
Mas não o sei viver.
Viver segundo as promessas, que são suas, permanecendo no tempo – Chrónos e Kairós – transpassada pela espada, fagulha pathética que atravessa os corações tão padecidos quanto apaixonados.
Viveste assim: possuído pelo Amor, levantaste da mesa, retiraste o manto, tomaste uma toalha e te cingiste com ela. Em seguida, sem demora, começaste a lavar os pés daqueles.
Aqueles a quem chamavas “amigos”.
Aqueles com quem estavas unido por uma doce intimidade.
Companheiros com quem partias o mesmo pão.
Aqueles cuja traição não é possível suportar.
Mas suportaste.
Suportaste e carregaste para fora.
Suportaste e perdoaste.
Suportaste e redimiste.
Suportaste e transformaste.
Saberei eu também padecer o amor?
Ensina-me a, como Tu, não apenas sofrer o fracasso, mas assumi-lo, colocá-lo aos ombros e ir até o fim.
Ajuda-me a não voltar atrás do que até agora, contigo, vivi e falei.
Para que eu possa, como Tu, viver na carne segundo o Espírito, ensina-me a rezar a tua oração, a que transforma o derramamento de sangue em oferenda. Quando todo clamor e lágrimas, te apresentaste por inteiro Àquele em cujas mãos tudo se afirma e tudo cresce.
Ensina-me a trocar por ofertar e abandonar-me verbos tão corriqueiros para mim, como ter, reter, ganhar, conquistar, dominar, competir, possuir, poder, vencer.
A pedra foi retirada.
Aquela que me esmagava, mas também me escondia.
Desnudada, seguirei teus passos?
“Tu o dizes”, respondes-me na Paixão.
Empresta-me tuas palavras, para que as minhas sejam: “Em tuas mãos entrego o meu espírito”.
(Escrito na Semana Santa de 2009)